Após sete cortes consecutivos na taxa básica de juros, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) decidiu “estacionar” a Selic na reunião finalizada na última quarta-feira (19). Portanto, a taxa continua em 10,5% ao ano, mesmo patamar do mês passado, mas olhando para a frente, ainda não há previsibilidade sobre a trajetória do juro. Diante dessa situação, os fundos de investimentos imobiliários (FIIs) merecem um olhar atento do investidor.
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O consenso estabelecido no Boletim Focus, do BC, aponta que a Selic deve continuar em 10,5% ao ano até o final de 2024. Ou seja, a aposta majoritária é de que não haverá mais cortes, pelo menos este ano. Contudo, há quem veja ainda algum espaço para redução. “Acho que um nível mais aceitável (para a Selic) fica próximo de 10%, só que há mudança do cenário ao longo do período”, afirma Jansen Costa, sócio fundador da Fatorial Investimentos, a respeito de uma queda de braço que se desenrola entre governo e BC.
De um lado, o Executivo pressiona por cortes nos juros, que no curto prazo impulsionam a economia. Por outro, a autoridade monetária tem o compromisso de controlar a inflação – e as perspectivas de alta dos preços em função da disparada do dólar e aumento de gastos pelo governo limitam a janela para reduzir a Selic.
“O comitê, unanimemente, optou por interromper o ciclo de queda de juros, destacando que o cenário global incerto e o cenário doméstico marcado por resiliência na atividade, elevação das projeções de inflação e expectativas desancoradas demandam maior cautela”, diz o Copom, em nota. “A política monetária deve se manter contracionista por tempo suficiente em patamar que consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas.”
Os juros altos nos Estados Unidos também impedem um afrouxamento monetário mais agressivo no Brasil. Via de regra, quanto menor a distância entre o juro americano e o brasileiro, menos atrativo os ativos domésticos ficam aos olhos dos investidores estrangeiros. Como consequência, a tendência é de que mais dólares saiam do País, aumentando a inflação por aqui – e este ponto se tornou crucial nas últimas semanas para entender a dinâmica de retorno dos FIIs.
Por último, ainda existem as incertezas trazidas pelo término do mandato de Roberto Campos Neto, atual presidente do BC, no fim deste ano. Apesar dos vários fatores de imprevisibilidade, a visão é de que, certamente, teremos juros mais altos por mais tempo. Esse cenário e bem diferente do esperado no início do ano, quando a expectativa era de que a Selic chegaria a 9% até o fim de 2024.
Fundos imobiliários menos atrativos?
Alguns dos ativos mais impactadas pelos juros altos por mais tempo se encontram dentro da classe de fundos imobiliários. De acordo com Felipe Ribeiro, diretor de investimentos alternativos do Clube FII, um dos primeiros efeitos desta situação é a diminuição da atratividade da indústria de FIIs, como um todo.
A Selic serve de parâmetro para o rendimento dos papéis de renda fixa. Logo, com títulos conservadores rendendo mais e por mais tempo, a tendência é de que os FIIs, assim como os demais ativos de renda variável, fiquem pressionados. Uma procura menor por esses fundos acaba reduzindo os preços das cotas e diminuindo, por consequência, as emissões. “Quando o valor patrimonial (quanto as cotas deveriam valer em função do patrimônio do fundo) está abaixo do preço de tela (preço atual das cotas) novas emissões perdem vantagem”, diz Ribeiro.
A mesma visão tem Jorge de Almeida Silva, assessor CFP® e sócio da Fortuna Investimentos. “Taxa de juros e FIIs tem uma relação inversamente proporcional. Quando um sobe, o outro cai.”
Dividendos resilientes
Apesar de a Selic mais alta do que o previsto anteriormente impactar negativamente a demanda por fundos imobiliários, isto não significa que os FIIs devam performar mal ou diminuir a distribuição de dividendos. Principalmente, quando o assunto envolve os “FIIs de papel”, aqueles atrelados a Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs) ou Letras de Crédito Imobiliário (LCIs), o viés para dividendos aponta para alta.
Entre os FIIs de papel, há dois grandes grupos: aqueles cujos ativos majoritariamente são corrigidos pelo CDI e os reajustados pela inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).
No primeiro caso, os juros altos por mais tempo devem continuar impulsionando a distribuição de dividendos, já que o CDI acompanha a variação dos juros básicos da economia. No segundo, uma esperada alta do IPCA – e o consequente reajuste dos ativos na carteira do fundo – deve seguir alimentando a distribuição de dividendos, ainda que tenha ocorrido uma “marcação a mercado” negativa no patrimônio desses produtos.
“Marcação a mercado” é o termo utilizado para designar a variação do preço dos papéis de renda fixa antes do vencimento do título. Em termos gerais, momentos como o atual, em que as perspectivas para a inflação e juros sobem, os títulos prefixados ou híbridos – como CRIs que remuneram a IPCA mais um prêmio – desvalorizam nas carteiras. É por isso que o patrimônio dos FIIs que têm títulos IPCA+ sofreram um reajuste negativo.
“Embora esses fundos imobiliários tenham efeito negativo na questão contábil, terão uma distribuição de dividendos maior, porque teremos mais inflação e juros”, explica Ribeiro.
Essa também é a visão de Renato Chanes, analista da Ágora Investimentos. “Os dividendos permanecem bastante resilientes. Quando a gente olha para fundos imobiliários que pagam CDI mais um prêmio (CDI+), não importa se o juro de longo prazo sobe. Basicamente, o CDI é a Selic à vista, não tem tanta oscilação”, afirma. “E no caso dos fundos imobiliários IPCA+, pode haver crescimento dos dividendos em função da inflação maior a ser apurada daqui pra frente.”
Vitor Martins, sênior partner e head de crédito da VBI Real Estate, vai na mesma direção “Os CRIs indexados ao IPCA se beneficiam dos aumentos na inflação, enquanto os vinculados ao CDI aproveitam diretamente o aumento das taxas de juros. Assim, uma gestão estratégica e ativa, que adapte continuamente a carteira às mudanças do mercado, é essencial”, afirma.
De acordo com levantamento feito por Einar Rivero, da Elos Ayta, nos últimos 12 meses (junho de 2023 a junho de 2024) os fundos de papel apresentaram um Dividend Yield (DY, rendimento em dividendos) de 11,54%. No mesmo período, o CDI foi de 11,8%.
Por outro lado, Silva, da Fortuna Investimentos, chama a atenção para o risco nos fundos imobiliários de papel em um cenário de inflação crescente: a possibilidade de inadimplência. Os devedores dos CRIs desses fundos podem não conseguir arcar com os pagamentos atrelados ao IPCA. “Tivemos diversos exemplos no ano passado, de fundos que receberam padrão (calote)”, diz Silva. “Com juro alto, as pessoas param de viajar, de consumir, e os empreendimentos acabam não conseguindo honrar com os compromissos. Mesmo antes da catástrofe do Rio Grande do Sul, houve empresas que deram default na cidade de Gramado.”
“Fundos de tijolo” sofrem mais
Há uma segunda categoria de fundos imobiliários, que são os “FIIs de tijolo”. Em vez de CRIs ou LCIs, essas aplicações investem em imóveis reais, como galpões logísticos, prédios comerciais e shoppings centers. Os dividendos vem do pagamento dos aluguéis destes estabelecimentos. Geralmente, esses FIIs estão mais correlacionados à “economia real”. Ou seja, sofrem mais com os juros altos, que esfriam o consumo e limitam o crédito das empresas. Com a perspectiva de uma Selic mais alta, os fundos de tijolos devem ser impactados negativamente.
Para Rafael Uehara, analista de FIIs da Genial, essas aplicações estão bastante descontadas, mas são oportunidades para quem pensa no longo prazo. “Os fundos de tijolos, nesse cenário de manutenção da Selic, podem permanecer lateralizados em termos de preço, uma vez que estão pressionados por um ambiente incerto e expectativas futuras deterioradas. Sem uma perspectiva de melhora, podemos observar um mercado sem grandes valorizações significativas”, afirma Uehara.
No curto e médio prazo, são os fundos imobiliários de papel, os grandes destaques. “Permitem o investidor estar posicionado em estruturas de renda fixa via renda variável, com distribuição mensal de dividendos e rentabilidade próxima dos níveis de juros atuais”, diz o analista de FIIs da Genial.
Chanes, da Ágora, aposta mais em fundos de papel para o médio prazo. Na virada do ano, a percepção era de que os FIIs de tijolo performariam melhor com a queda da Selic, mas com a inversão de perspectivas, a carteira mudou. “Estamos 40% em fundos de papel, 10% em fundos de fundos (FOFs), que são basicamente fundos de papel também. E o restante está em fundos de tijolos”, diz.
Já para Ribeiro, do Clube FII, a grande – e velha – aposta está na diversificação. Isto significa mesclar fundos de tijolos e de papéis conforme o perfil do investidor. Por exemplo, quem está na fase de acumulação para aposentadoria deve focar mais nos fundos de tijolo neste momento. Enquanto quem está em fase de recebimento, deve se concentrar em fundos de papel, que remuneram a inflação do período. “É uma resposta ‘chata’, mas a diversificação é o que salva”, afirma Ribeiro.
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